Porque a defesa de um Serviço Nacional de Saúde é fundamental, divulgamos aqui uma importante peça publicada em Diário da Republica a 02 de junho de 2016.
Resolução da Assembleia da República n.º 98/2016
Por um Serviço Nacional de Saúde sustentável, com cuidados de saúde de qualidade e equidade no acesso
A Assembleia da
República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição,
recomendar ao Governo que:
1 — Não reverta
a sustentabilidade económica e financeira já alcançada pelo Serviço Nacional de
Saúde (SNS) e adopte, para o efeito, as seguintes medidas:
a)
Generalize, de forma progressiva, um modelo de financiamento das unidades de
saúde que privilegie os resultados e a retribuição por objectivos;
b)
Uniformize os indicadores de desempenho e de qualidade entre os hospitais do
SNS e os hospitais em regime de Parceria Público -Privada, alargando a todo o
SNS os mecanismos de penalização em caso de incumprimento;
c)
Garanta a sustentabilidade financeira dos hospitais e restantes instituições do
SNS;
d)
Aperfeiçoe a arquitectura do sistema de controlo de hospitais, revisitando a
articulação Administração Regional de Saúde (ARS) e a Administração Central do
Sistema de Saúde, I. P. (ACSS), e separando o financiamento da provisão de
cuidados de saúde;
e)
Lance o concurso para o Hospital de Lisboa Oriental, assumindo a sua construção
como a primeira prioridade em termos de novos hospitais, em decorrência dos
trabalhos desenvolvidos na anterior Legislatura pela Unidade Técnica de
Acompanhamento de Projectos (UTAP);
f)
Sistematize de forma regular e previsível a totalidade dos indicadores de
controlo da actividade;
g)
Aprofunde o sistema de centralização das compras e serviços partilhados,
reforçando a utilização das tecnologias de informação;
h)
Prossiga o esforço de redução da dívida do SNS aos seus fornecedores;
i)
Monitorize a utilização de recursos no SNS, em especial dos mais dispendiosos e
de uso excepcional, realize uma análise comparativa e estabeleça melhores
práticas na utilização dos recursos;
j)
Implemente, a partir da reorganização de serviços já existentes, o Sistema
Nacional de Avaliação de Tecnologias da Saúde (SINATS), já legalmente previsto,
reforçando as capacidades da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da
Saúde, I. P. (INFARMED, I. P.), com estruturas que garantam o acompanhamento da
situação a nível nacional e que estabeleçam parcerias com os organismos já
existentes a nível internacional;
k)
Lance um programa de combate ao desperdício no SNS, com enfoque no uso da
melhor evidência disponível na escolha das intervenções diagnósticas e
terapêuticas, bem como através de sistemas informatizados de organização e
gestão e, ainda, com a implementação de um programa de controlo de gastos de
consumíveis, incluindo água e energia;
l)
Conclua a desmaterialização da receita médica a 100 %, completando o projecto
dos anteriores Governos;
m)
Lance um programa formal de reutilização de dispositivos clínicos face aos
conhecimentos adquiridos na vigência dos últimos Governos;
n)
Assegure a autonomia e sustentabilidade da ADSE —Direcção -Geral de Protecção
Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública, prosseguindo a
reforma iniciada pelos Governos anteriores e mantendo os contribuintes portugueses
sem financiar este subsistema;
o)
Continue a aperfeiçoar a legislação sobre conflitos de interesses.
2 — Continue a
melhorar a qualidade e a equidade no acesso dos utentes do SNS aos cuidados de
saúde, e adopte, para o efeito, as seguintes medidas:
a)
Crie um processo único do utente, que assegure a portabilidade, entre
prestadores, da informação relevante sobre a condição clínica do utente do SNS
ao longo de todo o seu percurso no sistema de saúde;
b)
Alargue a oferta de serviços de saúde, adequando –os às necessidades que forem
sucessivamente evoluindo e potenciando a transição de cuidados prestados em
instituições para cuidados de proximidade, em articulação com as respostas de
parcerias da comunidade, aumentando a resposta a nível local nas ofertas de
reabilitação e cuidados após hospitalização;
c)
Aumente a autonomia aos hospitais, já iniciada pelos anteriores Governos,
designadamente ao nível do recrutamento para serviços de urgência e dos
investimentos;
d)
Aumente a coerência da rede hospitalar, desenvolvendo novos modelos de
articulação intra e inter –hospitalares e de cooperação entre os hospitais e as
instituições de ensino superior, bem como uma gestão mais eficiente dos
recursos, nomeadamente através da concentração das respostas clínicas de maior
diferenciação, sem prejuízo da salvaguarda da equidade territorial de acesso;
e)
Aumente a taxa de ocupação de camas hospitalares e da redução da demora média
de internamento, designadamente quando se trate de próteses de anca ou acidente
vascular cerebral, reforçando a prestação de cuidados domiciliários;
f)
Evite a realização de procedimentos quando os mesmos sejam clinicamente
considerados desnecessários, designadamente nos casos de cesarianas e de
hemodiálise;
g)
Promova o aumento da intervenção dos médicos especialistas de medicina geral e
familiar em toda a rede de prestação do SNS;
h)
Continue a implementação e criação de redes de especialidades para a correta e
atempada referenciação dos utentes;
i)
Continue a promover a elaboração e divulgação de Normas de Orientação Clínica
(NOC), garantindo procedimentos clínicos acessíveis, eficazes e eficientes;
j)
Assegure a realização de auditorias clínicas que garantam o cumprimento das NOC
e promovam a adesão geral dos profissionais às boas práticas;
k)
Progrida no objectivo de assegurar o acesso a médico de família para todos os
portugueses, até ao final de 2017, minimizando as atuais assimetrias regionais
de cobertura;
l)
Generalize a figura do «enfermeiro de família» em todas as unidades
assistenciais dos cuidados de saúde primários;
m)
Promova a aproximação do modelo de funcionamento das Unidades de Cuidados de
Saúde Personalizados ao das Unidades de Saúde Familiar, incluindo o equilíbrio do
modelo remuneratório dos profissionais, de forma a garantir a acessibilidade de
toda a população portuguesa a um modelo homogéneo de cuidados de saúde;
n)
Implemente formas de gestão partilhada dos cuidados de saúde primários com as
autarquias locais, designadamente em zonas onde se revele pouco propícia a
criação de Unidades de Saúde Familiar nos moldes já existentes;
o)
Implemente uma Unidade de Cuidados na Comunidade em cada concelho;
p)
Conclua uma rede de serviços de emergência com a instalação de, pelo menos, um
Posto de Emergência Médica (PEM) em cada concelho e aperfeiçoamento de uma rede
coerente de Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação (VMER) e helicópteros
de emergência médica;
q)
Dê cumprimento à Estratégia Nacional para a Qualidade na Saúde, estabelecida no
Despacho n.º 5613/2015, de 22 de maio, e ao Plano Nacional para a Segurança dos
Doentes, aprovado pelo Despacho n.º 1400 -A/2015, de 2 de fevereiro;
r)
Institua tempos máximos de espera na realização de exames complementares de
diagnóstico e terapêutica;
s)
Aumente a quota dos medicamentos genéricos, em unidades (percentagem de
unidades de medicamentos genéricos no total de medicamentos comparticipados
pelo SNS), dos 47 % (dezembro de 2015) para os 60 %;
t)
Aumente o número de vagas para pré -graduados e especialistas, a fim de
qualificar os jovens médicos portugueses e de promover o planeamento integrado
da formação médica;
u)
Divulgue o número de profissionais registados no âmbito das terapêuticas não
convencionais e conclua o processo de regulamentação dessas terapêuticas
iniciado pelos anteriores Governos.
3 — Continue a
garantir a redução da carga de doença, com melhor promoção da saúde e mais
prevenção das doenças, e adopte, para o efeito, as seguintes medidas:
a)
Assuma uma visão do papel do sistema de saúde em Portugal que o dirija para o
aumento de anos com vida saudável e não apenas para o crescimento da
longevidade;
b)
Cumpra as metas e os prazos estabelecidos pelo Plano Nacional de Saúde, nos
Programas de Saúde Prioritários e no Plano Nacional para a Redução dos
Comportamentos Aditivos e das Dependências, com especial enfoque na necessidade
de reduzir a mortalidade que ocorra antes dos 70 anos de idade para menos de 20
%, até 2020;
c)
Implemente mecanismos legais que determinem a avaliação de impactos na saúde de
todas as políticas relevantes, nomeadamente no que disser respeito a grandes obras
públicas, transportes, urbanismo, segurança pública, política alimentar, educação,
emprego e fiscalidade;
d)
Implemente medidas que conduzam a uma melhoria dos padrões de regime alimentar,
com especial enfoque no aumento de consumo de produtos agro-alimentares de produção
nacional;
e)
Promova a generalização de estratégias municipais e intermunicipais de saúde
que adaptem e cumpram, ao nível concelhio, os objectivos do Plano Nacional de
Saúde às populações de cada comunidade local;
f)
Promova iniciativas de base intersectorial, designadamente com entidades com
maior proximidade à população, nomeadamente autarquias, serviços de apoio
social, escolas e empresas, por forma a aumentar a literacia dos cidadãos em
matérias relacionadas com a protecção da salubridade do ambiente, hábitos de
vida saudável e autocuidados;
g)
Reforce a aposta na protecção e prevenção em saúde, através da detecção precoce
de doenças crónicas, em especial daquelas com maior prevalência, como sejam a hipertensão
arterial, a diabetes e as doenças neurodegenerativas, e pela criação de
incentivos para que os serviços de cuidados de saúde primários desenvolvam mais
actividades de protecção e prevenção junto dos utentes e das comunidades
locais;
h)
Reforce as dotações para os programas prioritários, designadamente o Programa
Nacional de Prevenção e Controlo de Infecção e de Resistência Antimicrobiana,
lançado pelo XIX Governo Constitucional;
i)
Cumpra a Resolução da Assembleia da República n.º 105/2015, de 5 de agosto, que
reforça as medidas de prevenção, controlo e tratamento da diabetes;
j)
Reforce medidas conducentes à redução de acidentes rodoviários e de trabalho;
k)
Implemente medidas que conduzam a uma melhoria da saúde mental em Portugal,
nomeadamente através de uma maior acção psicoeducativa nas escolas, famílias e locais
de trabalho, bem como mais investimento na formação dos profissionais de saúde
que conduza a diagnósticos mais precoces e intervenções, preferencialmente de
base comunitária, mais céleres, melhor adequadas e continuadas no tempo;
l)
Adopte medidas que promovam, sempre que clinicamente adequado, a redução da
prescrição e consumo de medicamentos antibióticos e ansiolíticos da classe das benzodiazepinas.
Aprovada em 29 de abril de 2016.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo
Ferro
Rodrigues.
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