São inúmeros os fatores contribuintes que influenciam a prestação de cuidados. Alguns conseguimos controlar de forma mais direta. Outros não.
Hoje quero partilhar como uma falha no processo de fabrico/controle dos Dispositivos Médicos (DM’S), neste caso foram os Sistemas de Administração de Sangue, provocaram a eliminação de duas unidades de concentrado de eritrócitos.
Quando uma empresa nos apresenta um dispositivo médico (DM) a concurso, disponibilizando a respetiva “Ficha Técnica” e uma “Declaração de Conformidade” com todas as normas possíveis, não estamos obviamente à espera que isto aconteça:
1º Caso - “O Sistema de Administração de Sangue que foi acoplado à unidade de sangue CE XX/XXX destinada ao Doente com o processo clínico nº xxx apresentava uma solução de continuidade (um buraco) que levou ao derrame de sangue da unidade e inutilização da mesma.
2º Caso - “O Sistema de Administração de Sangue que foi acoplado à unidade de sangue CE XX/XXX destinada ao Doente com o processo clínico nº xxx apresenta uma fuga junto à parte inferior da camara de gotejo, na zona de solda entre a câmara de gotejo e o tubo. Desta fuga resultou o derrame de sangue, o que originou a inutilização da unidade de sangue.
Como é óbvio o Serviço de Sangue teve de compatibilizar, para ambos os Doentes, novas unidades de sangue que foram posteriormente administradas.
O que fazer nestas situações?
- Identificar claramente o problema – Neste caso uma falha clara dos Sistemas de Administração de Sangue;
- Identificar a Marca, Referência e Lote dos DM’s envolvidos (NOTA: é fundamental reter os DM’s para entrega ao Fabricante/Fornecedor);
- Informar imediatamente o Fabricante/Fornecedor, para que tome conhecimento dos incidentes, e inicie um processo de investigação próprio;
- Notificar o INFARMED/Divisão de Dispositivos Médicos – através da Ficha de Notificação para Utilizadores disponível no site do INFARMED, que é enviada por correio electrónico. É um processo muito simples e é uma responsabilidade de todos os profissionais, e neste caso uma responsabilidade acrescida dos Gestores de Risco/Grupos de Gestão do Risco de cada instituição.
É claro que depois de resolvidas as questões “técnicas” da notificação, sobram ainda inúmeras questões, igualmente importantes.
Por exemplo. Mais do que “compensar financeiramente” a Instituição onde ocorrem os incidentes, pelo valor dos sistemas de sangue com defeito, importa não esquecer o mais importante - foram duas unidades de sangue – um bem escasso e sem preço – para o lixo com o consequente atraso na prestação de cuidados aos Doentes.
O representante do Fabricante/Fornecedor voltou a assegurar que tais incidentes não voltaram a ocorrer e que não tem conhecimento de incidentes semelhantes noutras Instituições a nível nacional. Será mesmo assim, ou são os Profissionais e as Instituições que não notificam ou o fazem apenas “informalmente” não ficando disso registo oficial no INFARMED?
- Como é que tais garantias podem ser dadas? Quando um incidente semelhante já tinha ocorrido em 2012, tendo nessa altura sido devidamente identificado e notificado ao Fabricante/Fornecedor e ao INFARMED?
- Quando é que a Instituição toma a decisão de substituir o fornecedor do DM, deixando de basear a sua decisão de adjudicação no fator “preço mais baixo” e passa a utilizar como principais critérios os aspetos técnicos (definidos pelos utilizadores), a boa experiência de utilização, a correta adequação à função, e só depois o facto “preço”?
- Não deveria o INFARMED publicitar no seu site uma lista das notificações recebidas, de forma a alertar todas as Instituições onde os DM’s são utilizados?
Apenas com uma ação conjunta podemos esperar mudar alguma coisa.
Por outro lado, se estes são os únicos incidentes, com este tipo de DM, a nível Nacional, a sua relevância é pouca, mas tenho muitas dúvidas se de facto tal seja verdade.
Fica aqui a partilha e o apelo à notificação.