domingo, 29 de outubro de 2017

Está a chegar uma crise de antibióticos - e todos somos responsáveis por lutar contra isso | SD269

Há alguns anos atrás, levei meu filho a um centro de atendimento permanente com um corte feio no joelho. Entrámos num consultório e o enfermeiro lavou as mãos, colocou umas luvas e começou a examinar a ferida. O telefone tocou, ele atendeu o telefone com as luvas e depois voltou para o joelho do meu filho.
Quando lhe pedi para remover as luvas e lavar as mãos, ele parecia envergonhado. Ele apercebeu-se que, ocupado e distraído, esquecera os fundamentos da prevenção de infeções e estava mortificado.

No início deste mês, despertamos para a notícia de que um "apocalipse pós-antibiótico" poderia ser uma realidade em apenas 20 anos. A Chief Medical Officer para a Inglaterra, Sally Davies, alertou que, no futuro, mesmo uma cirurgia menor poderia levar a uma infecção potencialmente fatal, a menos que tomemos medidas para prescrever menos antimicrobianos.

Precisamos urgentemente de procurar soluções globais para este problema, mas cada um de nós também pode contribuir todos os dias para esta luta contra a resistência aos antimicrobianos (RA).

"Temos sorte em ter agora o conhecimento subjacente para apoiar as nossas intervenções de prevenção de infecção", afirmou Sally Davies.

Existe muito trabalho em desenvolvimento nas organizações do SNS para melhorar a administração de antibióticos. Veja-se o que se está a alcançar com o Programa de Prevenção e Controlo de Infecções e de Resistência aos Antimicrobianos (PPCIRA), sediado na Direção-Geral da Saúde – Todos têm um papel importante a desempenhar no seu sucesso.

Juntamente com essas iniciativas, cada um de nós (profissional de saúde) têm um papel fundamental na quebra da cadeia de infecção e na prevenção de infecções que ocorrem em primeiro lugar para que não haja necessidade de antibióticos - a higiene das mãos é fundamental para isso.

Conhecemos a importância da higiene das mãos na prevenção das infecções desde a era pré-antibiótica da década de 1840, quando um médico húngaro, Ignaz Semmelweis, observou que as taxas de infecção caíram dramaticamente quando os médicos lavavam as mãos antes de assistirem às mulheres durante o parto.
Florence Nightingale, uma campeã da higiene das mãos, identificou os mesmos benefícios no seu hospital em Scutari.
Temos sorte de ter agora o conhecimento subjacente para apoiar as nossas intervenções de prevenção de infecção.

Com base na informação que já possuímos, todos os profissionais de saúde que entram em contacto com um doente podem contribuir de forma pessoal para enfrentar a resistência aos antimicrobianos utilizando sempre uma rigorosa técnica de higiene das mãos.

Há orientações claras sobre a higiene das mãos e sobre o uso de equipamentos de protecção individual, e todos nós precisamos ter a confiança para desafiar os outros profissionais se acharmos que sua prática é deficiente e ponha em risco a segurança do doente.

Nós precisamos proteger os antimicrobianos que temos para as gerações futuras e todo o profissional da saúde tem oportunidades todos os dias para contribuir para a solução.

"Pensando naquele dia no centro de atendimento permanente, estremeço ao contemplar as consequências se meu filho tivesse desenvolvido uma infecção associada aos cuidados e não existissem antibióticos para a tratar." - Eileen Shepherd

Texto da autoria de Eileen Shepherd, editora clínica na www.nursingtimes.net e aí publicado a 26 de Outubro de 2017. Texto adaptado por Fernando Barroso.

UM DIA, SERÁS TU O DOENTE!

sábado, 28 de outubro de 2017

A Formação em Segurança do Doente não tem de ser Complicada - SD268

Depois de mais um período intenso de formação e partilha com mais de 120 formandos de diferentes categorias profissionais (Médicos, Enfermeiros, Assistentes Operacionais, Assistentes Técnicos e TDT's), confirmo o que à muito venho a defender:

- Uma formação em "Segurança do Doente" estruturada de forma simples e apelativa, que incorpora mais de 50% de prática simulada e exemplos práticos, cativa qualquer profissional e “prende” à sala até o profissional mais renitente.

Como é que eu estruturo as minhas sessões?

1. Estabelecer os conceitos chave
Ao estabelecer os conceitos chave não me limito a ler ou apresentar a definição do conceito.
Eu explico aos formandos a minha própria interpretação de cada conceito e de seguida apresenta exemplos práticos. Desta forma o conceito é mais facilmente compreendido por todos.

2. Utilizar a “prática simulada”.
Nem sempre é possível ir ao “terreno” e praticar a aplicação de algumas ferramentas – Avaliação do Risco; Análise das Causas Raiz; HFMEA; Notificação de incidentes – Mas é sempre possível transportar essas ferramentas para a sala e fazer prática simulada com resultados muito bons para experiência do formando.

3. Não ter medo de partilhar casos e exemplos reais
Em segurança do doente tenho aprendido que tudo pode acontecer.
Também sei que aquilo que ocorre numa instituição pode não acontecer noutra, ou que os profissionais de diferentes em instituições notificam de formas diferentes e tem diferentes preocupações.
A verdade é que a partilha de casos e exemplos reais é cativante e constitui uma excelente forma de deixar bem claro que a segurança do doente deve ser uma prioridade e que o dano para o doente como resultado da prestação de cuidados de saúde é muitas vezes catastrófico.

Tão importante como “saber” é “fazer”.
Para alcançar os meus formandos eu não posso ser “enfadonho”.
Acredito que todos querem “fazer bem” e sei que todos querem conhecer o que efectivamente acontece aos doentes através da minha experiência.
Pelas reacções que recebo - por vezes emocionadas – sei que este é o caminho.

Obrigado a todos os meus formandos. E não se esqueçam.


Um dia serás tu o doente!

sábado, 7 de outubro de 2017

Se os membros do governo tivessem de observar os doentes com dor talvez eles agissem para reduzir a falta de pessoal - SD267

"Se os membros do governo tivessem de observar os doentes com dor talvez eles agissem para reduzir a falta de pessoal."

Este é um texto construído com base num artigo de Jenni Middleton, publicado no Nursing Times.

O que é que te frustrou mais no último turno? O que é que te vai impedir de providenciar o nível de cuidado que desejarias dar aos teus doentes no próximo turno?

“Recentemente ocorreu um Congresso Anual de Enfermeiros Directores, em Manchester, durante 2 dias. Este é um evento onde os Enfermeiros Diretores se reúnem para discutir assuntos chave do momento e encontrar soluções para os desafios realmente difíceis que eles e as suas equipas têm de enfrentar.”

“Consegues imaginar qual foi o principal tópico de conversa - em cada uma das sessões individuais do programa independentemente do seu assunto? É a mesma resposta que tu provavelmente destes às duas primeiras perguntas colocadas no início deste artigo. A Falta de pessoal.”

“Enquanto se debate a implementação de inúmeros programas de saúde repletos de acrónimos e jargão técnico aquilo que realmente sabemos é que nenhum destes programa irá realmente funcionar se eles não forem implementados pelas equipas de enfermagem.”

“Não restou qualquer dúvida de que todos os enfermeiros directores que se encontravam no congresso estavam bastante preocupados com a forma como eles iriam conseguir enfermeiros suficientes para as suas enfermarias e cuidados de saúde primários.”

“As decisões tomadas pela tutela relacionadas com os recursos humanos e os seus níveis não são baseados na evidência nem tão pouco na segurança do doente. Elas são condicionadas directamente pelo dinheiro disponibilizado e isso toda a gente sabe.”

“Em 2017 ainda se tomam decisões acerca dos recursos humanos baseados no orçamento decidido pelo ministro das finanças em vez de dar atenção às necessidades ditadas pela procurar de cuidados pelos doentes.”

“Este assunto não se trata de chamar atenção sobre uma ou outra profissão. É sobre os cuidados aos doentes. Se o número de enfermeiros e outros profissionais diminui isso afectará negativamente os doentes, os seus resultados em saúde e a sua mortalidade.”

“Uma das enfermeiras presentes no congresso falou sobre as difíceis decisões que tem que tomar enquanto enfermeira directora. Ela afirmou: “Eu tenho 90 doentes no meu hospital que precisam de ajuda para se alimentar. Eu nunca tenho 90 enfermeiros em cada turno, portanto como é que eu faço para lhes entregar a comida a tempo? E o mesmo se passa com a administração de medicação. O que é que eu faço quando um doente tem de esperar uma hora para receber a sua medicação analgésica no pós-operatório?”

“Na realidade são os enfermeiros na linha da frente que tem de fazer face à agonia destas decisões e à agonia dos seus doentes. Mas são as decisões tomadas por órgãos de gestão que se encontram bem longe dos cuidados que prejudicam mais os doentes.”

“Talvez se fossem o Primeiro-Ministro, o Ministro das Finanças ou o Ministro da Saúde a administrar estas drogas fora de tempo, olhando para os doentes que estão à espera em camas molhadas porque não há tempo para mudar os lençóis e encarar os doentes com dor desnecessária, talvez assim eles considerassem olhar para os recursos humanos na saúde como uma prioridade.”

Como referi no inicio, o texto anterior é uma tradução de grande parte do artigo original. Mas a verdade que este artigo (do Reino Unido) contém não é muito diferente daquilo que se passa em Portugal.


E a Segurança do Doente. Como fica?
Fernando Fausto M. Barroso